sexta-feira, março 25, 2011

As catástrofes naturais e teológicas - Caio Marçal

As catástrofes naturais e teológicas

Por Caio Marçal
Já se tornou algo corriqueiro: Toda vez que alguma catástrofe acontece, levantam-se debates acalorados sobre Deus e se Ele está ou não por detrás de tais acontecimentos. Nesse cabo de guerra teológico, estão subentendidos a disputa do monopólio sobre o sagrado e a necessidade de mostrar quem tem todas as respostas.

No meio desse turbilhão de opiniões sobre a ação divina, está subjacente o interesse em encaixotar o sagrado em nossas teses e posicionamentos já que, para esses, caso Ele não caiba em suas fórmulas, suas convicções serão postas em descrédito e, no jogo de poder do torneio da fé, estarão em desvantagem. Quem ousa rebater essa ou aquela posição, logo é denominado de ser não pensante (um jeito bacana e politicamente correto de chamar o outro de burro) ou de herege (um jeito religioso de fustigar quem pensa diferente).

Não quero entrar no mérito da questão, até porque sei que não tenho todas as respostas. Reforço meu silêncio com a experiência que tive ao visitar a região serrana do Rio de Janeiro junto com meu amigos da Rede FALE, da Aliança Bíblica Universitária e Visão Mundial. Até hoje não encontro palavras para classificar tamanha destruição mesmo quase quarenta dias depois da calamidade. Confesso que ainda fico comovido e de olhos marejados.

Porém desejo chamar atenção para a ideia de que o fazer teológico deve nos levar à humildade e que diante do mistério só resta o silêncio reverente. Quando não se tem resposta para aquilo que não temos domínio, todos temos de ser honestos em admitir que não sabemos de tudo, em vez de fazer afirmações categóricas. Também devemos lembrar que Deus não cabe em nossas teologias e que afirmar onde Ele vai ou deixa de ir, além de um ato de arrogância, é uma completa tolice. Não dá pra colocá-Lo num tubo de ensaio!

Infelizmente não é isso o que acontece e o grau de infantilidade teológica nessas contendas é lamentável . Chega a ser doentio alguns setores da "inteligência evangélica" usarem os desastres naturais para defender seus “preciosos pontos de vista”. Além de ser um tremendo desrespeito às vítimas, atesta o tamanho da enfermidade da alma dos mesmos. Quando ideias e posições teológicas em enfrentamento são mais levadas em conta do que seres humanos em situação de extremo sofrimento, desamparo e carência, só revela que existe algo muito errado.

Se há algo que se pode falar sobre Deus em qualquer situação, seja boa ou ruim, é aquilo que o apóstolo João nos diz em uma de suas cartas: Deus é amor. Portanto, a única resposta cristã para as catástrofes é a solidariedade. A fé no Cristo, antes de ser uma elaboração de uma teologia ou de uma declaração de confessionalidade religiosa, é amar e dar a vida assim como o Mestre o fez.

Se nossos “doutores da lei” das diversas correntes que disputam a hegemonia nos debates relacionados às coisas da fé querem mostrar que sabem de Deus, que o demostrem sendo sensíveis à dor e ao sofrimento humano. Quem sabe talvez parem de praticar tanta "masturbação" teológica que só dão gozo a eles mesmos e não gera vida. Oremos para que os nossas lideranças evangélicas e teólogos de gabinete saiam de suas zonas de conforto e sejam promotores da vida!

Em Cristo, onde todas as divergências são dissipadas e onde todos hão de dobrar os joelhos.

Caio Marçal é cearense e missionário da Igreja de Cristo de Frecheirinha/CE. Atua também como Secretário de Mobilização da Rede FALE.

Um comentário:

Ruben Marcelino disse...

Se o autor diz que a única coisa que dá para dizer é o que diz João - "Deus é amor" -, então o autor toma como sua a afirmação de João e, consequentemente, junta-se à "inteligência evangélica" mencionada na defesa de "um precioso ponto-de-vista". Não acho que em uma catástrofe dê para dizer, como única coisa a ser dita, que Deus é amor, pois isso soa como um disparate. Acho que só dá para fazer alguma coisa, ser solidário, e nisso concordo com o Caio. E como assim o fazer teológico deve conduzir ao silêncio reverente diante do mistério? Parece-me que o fazer teológico deve, sim, conduzir ao grito crítico e irreverente, que reflete várias possibilidades de interpretação, até a de que Deus não seja amor. O silêncio não vai levar a lugar nenhum. A reflexão crítica, porém, pode ajudar a acolher melhor as dores de quem sofre.